Centro de Memória Domingos Félix do Nascimento (Cacique de Ramos)

O Cacique de Ramos é uma instituição formalmente constituída, sem fins lucrativos, fundada em 20 de janeiro de 1961 e em permanente atuação desde então. Está organizado como uma entidade recreativa e desde sua fundação participa do carnaval de rua da cidade do Rio de Janeiro como um “bloco de embalo”. Nessas seis décadas de existência, a agremiação alcançou notório reconhecimento popular na folia carnavalesca da cidade. O bloco se tornou um fenômeno de multidão, sendo referência com seus desfiles vibrantes e um repertório de sambas especialmente constituído para os seus cortejos. O Cacique é reconhecido pelo uso de símbolos visuais que são compreendidos como elementos de interculturalidade e de recriação de identidades, caso da própria denominação da agremiação e das fantasias de indígena estilizado usadas por seus componentes, exemplos de "antropofagia" cultural. Inicialmente, o Cacique de Ramos não possuía alas. A característica do bloco era a massa compacta e indiferenciada de homens e mulheres, todos trajando a fantasia de napa nas cores preto e branco, com alguns detalhes em vermelho. Na memória de foliões antigos esse foi o tempo da “Ala da Napa”. Os primeiros componentes com indumentárias próprias são notados em meados dos anos 70. As pioneiras alas a merecerem destaque no Cacique surgem por razões estéticas, em virtude das fantasias diferenciadas que seus integrantes confeccionavam: Ala da Ráfia, Ala das Plumas, Ala das Penas, Chuva de Prata. Aos poucos, aparecem também grupos de amigos, de bairro ou de profissão, que organizavam turmas com nomes associados ao imaginário indígena. Com a autorização do Cacique, elas passaram a desfilar no bloco ornando suas próprias fantasias e adereços, e não mais a indumentária de couro da napa. A memória dos componentes registra como exemplos dessa época: Apache (1ª fase), Comanche (1ª fase), Cheyenne (1ª fase), Navajo, Pantera, Moicano, Paixão. Muitas desaparecem na década de 1990, e a partir de 2005 houve o surgimento de novos grupos. São todos unidos por laços familiares e fraternos que os mantém próximos para além dos dias de carnaval. A agremiação ocupa sede permanente no bairro de Olaria. Este espaço abriga, desde a década de 1970, rodas de sambas que se transformaram em local privilegiado de interação musical e comunitária. A sonoridade dos pagodes caciqueanos foi revelada por meio do disco De pé no chão (1978) da cantora Beth Carvalho. A partir daí, desdobrou-se em um movimento que ajudou a florescer toda uma geração de compositores, intérpretes e músicos do samba carioca, a notabilizar uma nova instrumentação - o tantã, o repique de mão e o banjo, concebidos em suas rodas - e a consolidar o pagode do Cacique de Ramos como um intenso polo de sociabilidades e criação musical. Registre-se o revigoramento da prática do partido-alto, modalidade de samba de improviso de escassa reprodução, historicamente acalentado pelos participantes da sua roda de samba. O Cacique mantém-se ativo e realiza atividades recreativas e sociais. Finalmente, foi reconhecido como patrimônio imaterial do povo carioca por lei municipal, em 2005, e distinguido como um dos locus de recriação do partido-alto dentro do Dossiê das Matrizes do Samba do Rio de Janeiro, no ano de 2007. Este Dossiê subsidiou o pleito à titulação, concedida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que reconheceu como patrimônios nacionais o partido-alto, o samba de terreiro e o samba-enredo. O terreno que abriga a sede do Cacique de Ramos é contíguo ao terreno da Escola Municipal Clóvis Beviláqua, e há décadas o espaço da quadra do Cacique é utilizado para a realização de aulas de educação física e outras atividades do calendário escolar. Em 2012, foi celebrado o Termo de Convênio nº 167 entre o Município do Rio de Janeiro, por intermédio da Secretaria Municipal de Educação (SME) e a Empresa Municipal de Urbanização (Riourbe), e o Grêmio Recreativo Cacique de Ramos. O instrumento formalizou a prática do uso da quadra aos alunos da rede municipal para a realização de ações pedagógicas, promovidas pelo Cacique, por meio de cursos de formação musical (canto, percussão e cordas). Daquela data em diante, as oficinas passaram a ser realizadas em consonância com o acordado pelo referido Termo. O projeto vem sendo conduzido pela equipe gestora do próprio Cacique em parceria direta com as dirigentes da Escola Municipal Clóvis Beviláqua, unidade cujos discentes são o público-alvo das ações. Mediante isso, tal prática tornou-se política institucional do Cacique de Ramos. Desde a sua criação, o Cacique ensaiou, ou esteve sediado, em bairros da Leopoldina, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, e com este território desenvolve permanente e forte relação. Portanto, há seis décadas, a agremiação é ponto de lazer e referência para os moradores da região. À medida que passou a realizar pagodes como eventos públicos, na década de 70, o Cacique mantém como princípio não cobrar ingresso para o acesso aos seus eventos. Assim sendo, permanece como um espaço acessível e democrático de encontros e fruição cultural para toda a população, sem distinção. Em diversas oportunidades a quadra esteve aberta para ações sociais, seja a pedido da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, ou por iniciativa criada por sua própria Diretoria. Por solicitação da Prefeitura a quadra foi ponto de vacinação contra a covid-19. Por seu caráter inter-religioso e pela afirmação da negritude, o Cacique de Ramos firmou-se como uma instituição popular, símbolo da diversidade cultural e religiosa. O Cacique mantém importante e notória relação com tradições religiosas, tais como o Catolicismo Popular e a Umbanda. Isto colabora para a visibilização de manifestações religiosas que são alvo de preconceito em nossa sociedade. Saliente-se o fato da agremiação preservar , em terreno espaçoso, árvores e um casarão do início do século, isso dentro de área urbana e densamente povoada, carente de espaços com essas características.